terça-feira, 25 de outubro de 2011

Sobre Prisões e Sonhos

No último fim de sema, mais uma vez tive a oportunidade de fazer o curso “Como Funciona a Sociedade I” oferecido pelo grupo de formação política 13 de maio e organizado pelo DA (Diretório Acadêmico) de Pedagogia da UFF na Ocupação Manoel Congo no centro do Rio de Janeiro. Em linhas gerais, o curso versa sobre questões fundamentais da nossa sociedade a partir de uma leitura marxiana de conceitos como aparência e essência, valor, materialismo histórico e luta de classes. Entretanto, o que me motivou a escrever essas breves linhas não consta na metodologia proposta pelo 13 de maio, mas seu espectro ronda boa parte do pensamento revolucionário: a relação entre particularidades e universalidades.

Já no final do curso quando é proposto que os participantes imaginem estar perdidos em uma ilha deserta sem qualquer contato com a atual civilização e que de alguma forma pensem em uma organização para sobreviverem, teve início um instigante debate. Entre os participantes do curso havia três homossexuais e dois deles quando foi aventada a possibilidade do coletivo ter como base a poligamia para garantir a reprodução da espécie se posicionaram de forma contrária a deliberação do coletivo, sob a argumentação (mais do que justa por sinal) de que o coletivo estava tolhendo a sua liberdade individual e sua sexualidade em uma atitude repressora.

É posto na arena a questão central de nossa discussão: até que ponto o coletivo se sobrepõe as “liberdades individuais”? Ou é justo que as aspirações ou desejos individuais subordinem toda uma coletividade? Antes de qualquer resposta especulativa, considero imprescindível deixar claro em que terreno estamos pisando.

De início é fundamental estarmos atentos as condições materiais, nas quais a população da ilha está inserida. Não há qualquer tipo de ferramenta, técnica ou tecnologia, os ilhenses (como vou chamar a população da Ilha) possuem apenas a força do seu trabalho e da criatividade da mente humana para sobreviverem, isso significa que tal condição material representa um limite as potencialidades deste grupo. Para compreendermos melhor essa afirmação, imaginemos que um dos integrantes do grupo seja um renomado engenheiro da computação que já havia criado diversos softwares e sistemas operacionais “revolucionários”, qual seria a possibilidade na Ilha dessa pessoa realizar sua grande capacidade criativa? Quais os instrumentos que ele dispõe para isso? As respostas são óbvias, mesmo tendo a capacidade de produzir artigos altamente sofisticados, o nosso engenheiro não tem as condições materiais para tal empreendimento, ou seja, suas potencialidades foram reduzidas significativamente.

Passando novamente para a questão da sexualidade na nossa Ilha, o material também se impõe como limitador das potencialidades humanas. A população de ilhenses é bem pequena e a única possibilidade de manter a sobrevivência da espécie (para muitos cientistas e filósofos como Schopenhauer é uma questão biológica e instintiva para o homem) é a realização de todas as possibilidades de reprodução para promoção da variabilidade genética e garantia de geração de indivíduos que formem gerações futuras (não vamos esquecer que devido as condições materiais, a mortalidade infantil deve chegar a índices elevados). É por isso que em muitas sociedades primitivas, as mulher copulavam com todos os homem de um grupo, sendo este um fato imperativo para todos os homens e mulheres do clã.

Os ilhenses homossexuais não nasceram na Ilha, sendo assim, foram gerados e criados em condições materiais muito diferentes, na qual as questões da reprodução humana e manutenção da espécie estão longe de ser um imperativo para a sociedade. Esse fato lhes permite dar asas as suas sexualidades (potencialidade humana) sem qualquer prejuízo a coletividade. Com este breve exemplo, podemos perceber que as condições materiais apresentam-se como prisões ao exercício das potencialidades humanas. Uma vez superadas, e com o surgimento de novas condições, se descortina uma nova gama de possibilidades que podem ser realizadas.

Hoje não é muito diferente, as novas condições materiais da (pós)modernidade (forças produtivas) e a divisão do trabalho a partir de determinadas funções que cumprimos no sistema produtivo social (relações de produção) determina a nossa “situcionalidade” dentro de um modo de produção. Essa “situcionalidade” determina onde podemos enxergar e de que ponto estamos enxergando a realidade, ou seja, os limites de nossas potencialidades.

As novas tecnologias que diluem as informações ao “tempo real” e se propagam como temporalidade dominante a boa parte dos trabalhadores, não deixa tempo para pensamentos alternativos e para a expansão das possibilidades humanas, nos aprisionando em torno da corrida pela acumulação de capital.

É nesse sentido, como nos lembra o Geógrafo David Harvey, que temos recorrer ao utopismo dialético na medida em que temos consciência das condições sociohistóricas que nos limitam, entretanto, de alguma forma, buscamos realizar nossas potencialidades na busca de alternativas materialmente viáveis na busca de novos contextos sociohistóricos.

Além do mais para nós, espíritos contestadores e revolucionários, é fundamental estar atento a dialética universal-particular. Como já vimos as condições materiais determinam diversos pressupostos universais, isso significa que sempre haverá questões universais sobrepujando particularidades o que não significa o fim das mesmas. São nesses termos que a constante negociação entre o particular e o universal é condição sine qua non para qualquer projeto alternativo de sociedade.

Hoje existem diversos movimentos de resistência ao neoliberalismo e ao capitalismo, entretanto, muitos deles se perdem em reivindicações de problemas particulares que não são nunca completamente solucionados, uma vez que não é ceifada a fonte que os nutre. O que é imperativo é transcender as particularidades e chegar a alguma plataforma universal, só assim teremos condições de nos libertar dos grilhões que nos aprisionam e dar asas as nossas potencialidades.

E as particularidades? É claro, quando se faz uma escolha necessariamente estamos impossibilitando, mesmo que temporariamente, que outras possibilidades se realizem. Sendo assim, chegar a uma unidade entre os diferentes grupos que possuem plataformas transformadoras é uma atitude radical e dialética. Radical, pois significa escolher “isso e não aquilo” e dialética, pois ao transformar, estamos abrindo, uma vez que mudamos as relações de produção, novos horizontes para a realização das potencialidades humanas e novas frentes de negociação entre universalidades e particularidades.


Ele.

sexta-feira, 7 de outubro de 2011

A Metáfora Steven Jobs

Uma vez li que quando usamos uma metáfora possibilitamos ao interlocutor uma maior possibilidade de compreensão, por outro lado perdemos, na mesma proporção, a capacidade de dar conta da complexidade dos fatos reais. Passado o embrolho inicial, a única coisa que me passou pela cabeça com a morte de Steven Jobs foi justamente uma metáfora.



Para mim Steven Jobs é uma grande metáfora para a sociedade capitalista, pois ao mesmo tempo em que é fantástica no que diz respeito a criar condições materiais para tornar mais fácil e prazerosa a nossa curta jornada pela vida a torna cada vez mais penosa para grande parte da humanidade.

Hoje, sem sombra de dúvidas, temos tecnologia suficiente para liberar nosso espírito ao tempo livre. Tempo para curtir filhos (não os 4 meses de licença maternidade e os 4 dias de paternidade), para estudar (não para nos qualificar, mas para nos satisfazer), para nos dedicar a quem amamos. Entretanto, o tempo a cada dia que passa parece estar se afunilando em um beco sem saída. Somos funcionários proativos, dedicados e comprometidos com a empresa, aceitamos como quem recebe um designo dos deuses, a pobreza, a miséria, a falta de tempo para aqueles que realmente merecem o nosso tempo, a troco de que? Do consumo delirante e terapêutico?

O Grande gênio da tecnologia (como é chamado) nos proporcionou engenhocas interessantes que efetivamente mudaram certos paradigmas (se antes não se levava problemas do trabalho para casa, hoje nós os carregamos no bolso). Maravilhas tecnológicas são produzidas por 25 mil chineses 24 horas por dia, que encontram como única forma de liberar a suas famílias da prisão aterrorizante da super exploração das fábricas o suicídio (http://macworldbrasil.uol.com.br/noticias/2010/06/11/apos-suicidios-fabrica-de-iphones-pode-fechar-as-portas-na-china/).

Stven Jobs não é um pobre gênio que teve suas invenções profanadas por meios exclusos de sua utilização. Seu primeiro e ultimo bilhão foram construídos por suor e inspiração de uma mente genial e, também, por suor e sangue dos trabalhadores do mundo inteiro.



Ele

domingo, 11 de setembro de 2011

Para Quem não Acredita no Tio Sam

Eles mudaram, por diversas vezes, o curso da História sem nunca considerarem seres humanos obstáculos intransponíveis. Assassinaram a torto e a direito e enfiaram por nossas goelas as desculpas mais estapafúrdias, as mentiras mais descaradas. Fizeram do capital o que há de mais importante no mundo e todos os dias, matam milhares de fome, sede e doenças curáveis, sem nenhum remorso. Fazem o que bem entendem, com quem bem querem, como lhes bem convir.

Em 11 de setembro de 1973 eles contribuíram com o golpe que assassinaria milhares de pessoas, na tentativa de extinguir um sonho.
Quase conseguiram, mas o que fizeram foi adiá-lo.

Ao 11 de setembro que eles tentam apagar.


Ela


quarta-feira, 13 de julho de 2011

Soneto da Desventura

Quando o grande pecado é justiça

Quando o grande erro é o nós

Quando a grande resposta é inexorabilidade da natureza humana

Desventura


Quando a frieza do vil metal

queima as retinas

asfixia o peito

Desventura


Quando canto vira súplica

Quando direito vira benefício

Desventura


Quando há o encontro

Enquanto houver esperança

Aventura



Ele

domingo, 26 de junho de 2011

"O mundo não é, ele está sendo"

Ás vezes parece que você é o único chato que não se conforma com o estado atual das coisas e com o curso que elas têm tomado. Chega a dar um desânimo com a desmedida reprodução de certas idéias sem embasamento, fazendo crer que nunca o senso comum foi tão comum e ignorante.

Mas eis que surgem as manifestações, algumas muito, muito pequenas, mas ainda assim, são mais uma dose de ânimo. Sim, Paulo Freire, "o mundo não é, ele está sendo". Nada está perdido e nós não estamos sozinhos. Jamais estaremos.

Hasta la victoria.


P.S. Para descontrair sem desconcentrar.



Ela

segunda-feira, 30 de maio de 2011

Aprovação do novo Código Florestal e Žižek no Brasil

A última semana, de 22 a 28 de maio, foi deveras conturbada. Inúmeros acontecimentos espalhados pelo mundo inteiro invadiram os noticiários, principalmente através das redes sociais. Diante da opressão do Estado burguês a manifestação de trabalhadores em Barcelona, o assassinato de militantes camponeses em Rondônia e no Rio de Janeiro, a aprovação do novo Código Florestal na Câmara dos Deputados e a palestra do filósofo marxista Slavoj Žižek, me deixando desnorteado sem saber decifrar a enxurrada de idéias, revolta e tristeza que tomam conta dos meus pensamentos.

Como um boxer que se recupera de um duro golpe, tento organizar neste texto ao menos parte desta confusão mental, visto que todos os acontecimentos de uma maneira ou de outra encontram-se interligados, não custa lembrar mais uma vez que Marx nos alertou para a importância da totalidade, não vou aqui atribuir um valor exagerado ao acontecimento a ou b, pelo contrário, vou fazer uma breve análise apenas de um dos fatos mencionado a luz das idéias que recentemente me conquistaram desse eslavo Žižek.

Escolhi a aprovação do Novo Código Florestal por um simples motivo, ainda não havíamos discutido a temática neste blog. Já a escolha das idéias do intelectual eslavo para fazer a intermediação com o tema são ainda mais óbvias, todas presentes na sua palestra no último dia 24 de maio no Rio de Janeiro, na qual fui um atento e surpreso ouvinte.

Sem nenhuma surpresa (ainda mais com a implosão de escândalos envolvendo o governo, no caso do ministro Palocci), entretanto com muita tristeza e revolta que tomei conhecimento da vitória esmagadora do novo Código Florestal na Câmara dos Deputados (410 votos a favor e apenas 63 contra). Mas não vou aqui tratar de desmesuras políticas e morais dos nossos deputados, isso a nossa imprensa faz com propriedade. Quero dar alguns passos para traz e vislumbrar a problemática a partir de uma perspectiva mais ampla fazendo a seguinte questão: qual é a relação da aprovação do novo código e a crise ambiental na qual nos vivemos?

Para alguns pode até ser surpreendente a aprovação de um código que amplia as áreas de desmatamento na Amazônia, que padroniza a 15 metros a faixa de proteção de matas ciliares (matas ao longo dos cursos de rios) tanto para rios caudalosos como o Amazonas quanto para pequenos riachos e córregos, que regulamenta o cultivo em encostas e topos de morros e que anistia desmatadores, em um momento de crise ambiental no qual a nota principal é criar alternativas para tudo acima mencionado. Para mim parece muito óbvio. O modo de produção capitalista não vê limites para saciar sua fome de lucratividade, o metabolismo destruidor do capital, na sua essência, não encara a natureza como um fim, pelo contrário, considera um recurso a ser explorado ou reservado para futura valorização e exploração.

É nesse sentido que Zizek passa a acompanhar o nosso raciocínio, não podemos pensar que o senhor Eike Batista, 8º homem mais rico do mundo, dono de mineradoras e petroleiras pode pensar em limite para suas atividades, uma utilização “racional” destes recursos é igual a uma menor lucratividade. Ou pensar catástrofes ambientais como a ocorrida no Golfo do México como uma questão de irresponsabilidade da British Petroleum, como se a questão fosse moral da “boa” ou “má” companhia, da ambientalmente responsável ou a inescrupulosa e irracional. A questão é muito clara, para os dois casos, vivemos um modo de produção de nos impele a sugar ao máximo os recursos, ir até os limites impostos pela técnica para manter e aumentar as taxas de lucro das grandes companhias e as conseqüências são meros detalhes.

Detalhes, entretanto, bem inconvenientes, mas é ai que entra a ideologia dominante. Para desconstruí-la vou recorrer mais uma vez a Zizek, que nos diz que a ecologia é um problema não pelo que é dito (catástrofes, aquecimento global, etc), mas sim pelo que não é dito, ou seja, de que forma o discurso ambiental é utilizado como uma ferramenta política (ideologia). Em primeiro lugar, essa idéia de que o HOMEM está acabando com o equilíbrio presente na natureza e que precisamos restabelecê-lo é completamente irracional. A natureza não está em equilíbrio, ela é dinâmica, compreendida a partir de processos de destruição e construção (visto o tsunami no Japão). Essa visão irreal só nos afasta dos verdadeiros problemas, como é o caso de alguns movimentos ambientalistas que não tem compromisso nenhum com a transformação da sociedade.

Em segundo lugar, essa espécie de ambientalismo individual do “cada um faz a sua parte” separando o lixo para a reciclagem, usando “ecobag” e comprando alimentos orgânicos para salvar a natureza. Não que essas atitudes não sejam importantes, mas será que acreditamos mesmo que isso vai realmente mudar alguma coisa? Zizek afirma que funciona como ideologia, como por exemplo, quando assistimos a um jogo de futebol na televisão e esbravejamos com os jogadores, orientamos o time e ofendemos o juiz, sabemos que não podemos influenciar em nada na partida, mas queremos acreditar que sim. É o que acontece com as iniciativas individuais de “consumo consciente”, que sabemos que dificilmente mudaríamos algo, até porque os carros continuam nas ruas, a agricultura vive a base de petróleo (máquinas e insumos – NPK) e agrotóxicos, as indústrias metabolizam combustíveis fósseis, mas tais medidas nos fazem sentirmo-nos melhor, afinal, “estamos fazendo a nossa parte” mesmo que isso nunca vá efetivamente resolver o problema.

São nesses termos que encaro a aprovação do Novo Código Florestal, que sob o discurso de um uso sustentável, da geração de empregos e do desenvolvimento da nação, quebra-se mais uma barreira para o avanço do capital em nosso território. As grandes multinacionais, ruralistas e a burguesia em geral comemoram mais um passo rumo ao “uso sustentável que garanta o desenvolvimento de nosso país”. Sendo assim, em termos ambientais, o novo código nos remete ao título da palestra de Slavoj Žižek no Brasil: “a situação é catastrófica, mas não é grave”.


Ele

quarta-feira, 11 de maio de 2011

Carta aos Nossos Primeiros Heróis

Tem dias em que nos deprimimos, cientes da nossa voz em minoria, da nossa desarticulação enquanto grupo, da clareza dos nossos temores. Mas incrivelmente, com uma força que só a sensibilidade é capaz de oferecer, a tristeza se supera no pontinho de esperança que ganha um brilho incalculável na mente resolvida em ideologia e vira combustível para a luta. E não importa que nosso sangue tenha sido alimentado durante anos pela direita, quando ele amadureceu se fez livre e oxigenou nossos cérebros com compaixão, inteligência e coragem em praticar ambas. E a tendência, embora muitos terão o prazer de contestar, será o engrandecer, realizar e propagar desses valores.

Netos, filhos do discurso reacionário e fascista, em nossa adolescência encontramos portas abertas para o amor ao próximo e os alicerces para o conhecimento teórico que nos tornariam críticos da realidade e é isso que queremos que nossos filhos herdem. Mais do que olhos, cabelos e traços, mais do que habilidades e gosto para as artes, queremos que eles sejam sensíveis e críticos o que, sendo apenas o mais valioso, não há de constar em testamento.

E é por isso que consiguimos imaginar a dor daqueles que cederam genes para a nossa formação em constatar a desvinculação das nossas ideias das suas próprias, já que é um medo que nos assombra também. Mas podemos garantir que à grande parte disso lhes cabe a culpa, por nos terem tanto recheado o peito de amor que o único destino que nos coube foi o de expandí-lo para os outros seres humanos. Se somos quem somos, se nosso projeto de vida vai além de nós mesmos, também devemos isso a vocês, para seu desgosto e nosso orgulho.

Para além da divisão ideológica, seremos pra sempre sangue dos seus, amor que nasceu e floresceu a partir dos seus corações, mas terão de aceitar que enquanto houver direita, a esquerda integraremos, enquanto existir desigualdade e intolerância, haverá luta e enquanto esta existir, nela estaremos e morreremos.




Sangue do meu sangue, o sangue que hoje corre em minhas veias é uma variação do seu, mas as ideias que interligam minha mente e coração se desconectaram de você e encontraram paz na luta pelo próximo, sem levar contudo, o meu amor de menina.

O primeiro herói, a gente nunca esquece.

Ela

terça-feira, 26 de abril de 2011

Um Sorriso Nos Lábios

Hoje a crítica fica por conta do artista.


Um Sorriso Nos Lábios

Composição: Gonzaguinha

Vidro moído ou areia
No café da manhã
E um sorriso nos lábios
Ensopadinho de pedra
No almoço e jantar
E um sorriso nos lábios
O sangue, o roubo, a morte
Um negro em cada jornal
E um sorriso nos lábios
Noventa e cinco sorrisos
Suando na condução
E um sorriso nos lábios...

Mas sonha que passa
Ou toma cachaça
Agüenta firme, irmão
Na oração
Deus tudo vê e Deus dará
Ou então acha graça
É tão pouca a desgraça
Mas no fim do mês
Lembra de pagar a prestação

Desse sorriso nos lábios, é
Desse sorriso nos lábios, pois é
Desse sorriso nos lábios...

O jogo, a nêga, a loteca
A fome e o futebol
E um sorriso nos lábios
A taça, a vida, a dureza
Viva a beleza do sol
E um sorriso nos lábios
Os olhos fundos sem sono
Os corpos como lençol
E um sorriso nos lábios
O cerco, a vida, o circo
Silêncio, um medo anormal
E um sorriso nos lábios

Mas sonha que passa
Ou toma cachaça
Agüenta firme, irmão
Na oração
Deus tudo vê e Deus dará
Ou então acha graça
É tão pouca a desgraçaas no fim do mês
Lembra de pagar a prestação

Desse sorriso nos lábios, é
Desse sorriso nos lábios, pois é
Desse sorriso nos lábios...

quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

Uma Insurreição às Escuras

Nos últimos dias estamos sendo bombardeados com efusivas notícias acerca do grandioso movimento popular que vem se arquitetando no Egito para depor o então presidente e ditador Hosni Mubarak. Todo esse movimento midiático desenvolveu em mim uma larga desconfiança sobre os verdadeiros fins de tal processo histórico. Parafraseando o excelente título do filme documentário “A Revolução não será televisionada” dos irlandeses Kim Bartley e Donnacha O’Briain, suspeito seriamente de qualquer apoio dado pela imprensa e da pseudo “comunidade internacional” ao movimento popular. Meu ceticismo acerca dos resultados e benefícios à população da insurreição deposicionista foram parcialmente confirmados quando pela manhã deparo-me com a seguinte notícia no sitio do globo.com, um veículo de idoneidade inquestionável (para os que não me conhecem, deixo explicito o meu tom sarcástico!):



A fim de compreender melhor essa janela histórica que se descortina sob os nossos olhos recorro a um clássico autor marxista, Leon Trotsky. O autor da teoria da revolução permanente, em um livro homônimo, oferece-nos um arcabouço teórico que permite compreender tal processo histórico com outros olhos. Com todas as limitações que este veículo me impõe, arrisco-me a uma humilde análise de um fragmento do ideário trotskista acerca da união revolucionária entre camponeses, proletários e a pequena burguesia.

“Mas, esse fato essencial se realizou, também, em todas as revoluções vitoriosas ou semivitoriosas, sem exceção. Sempre por toda a parte, os proletários ou seus precursores, os plebeus e os camponeses, derrocaram os imperadores, os senhores feudais e os padres (...). Mas o que tem haver com isso a ditadura democrática? As antigas revoluções não a conheceram (...). Por quê? Porque a burguesia ia montada às costas dos operários e dos camponeses que faziam o trabalho ingrato da revolução.” (TROTSKY, 2007, p.124)


Esse breve trecho da obra de Trotsky deixa no ar uma pergunta fundamental para qualquer movimento de transformação na sociedade: quem dirige e quem toma o poder efetivamente? Não é difícil estabelecer uma relação entre as palavras do autor e os atuais acontecimentos no Egito. A população oprimida (esmagadora maioria da sociedade) é a única força política capaz de romper o curso da história, sem de forma alguma ignorar este fato, a minoria opressora, inteligentemente, utiliza a energia revolucionária popular para seguir delineando os meandros da história. Um exemplo? É fácil, 14 milhões de pessoas nas ruas dia a pós dia, semana após semana sob os olhares de aprovação das nações imperialistas (não vamos esquecer que Inglaterra, França, EUA sugaram e sugam com uma sede insaciável o suor dos trabalhadores egípcios) derrubaram um governo que cometeu o grave erro de se opor a quem o mantinha no poder. Quando esse mesmo movimento começa a ter uma iniciativa verdadeiramente progressista e autônoma de reivindicação por melhores salários e condições de trabalho, o novo governo que fora alçado ao poder por essas mesmas forças populares, mostra a sua verdadeira face. Mudam-se os atores, mas o enredo é o mesmo!


É o fim? Muito pelo contrário, mais uma vez as classes oprimidas demonstram a sua força. É uma injeção de adrenalina em nossos ideais de transformação da sociedade. O que temos que nos perguntar agora é quem está com as rédeas dessa carruagem revolucionária e como podemos tomá-la.


O processo histórico no Egito ainda não está terminado, aguardo ansiosamente as cenas dos próximos capítulos!



Ele