sábado, 26 de junho de 2010

Uma Inspiração

"A utopia está lá no horizonte. Me aproximo dois passos, ela se afasta dois passos. Caminho dez passos e o horizonte corre dez passos. Por mais que eu caminhe, jamais alcançarei. Para que serve a utopia? Serve para isso: para que eu não deixe de caminhar".
Eduardo Galeano

Foi lendo essa máxima que comecei a me indagar a respeito desse conceito: Utopia. Essa palavra é freqüentemente empregada num sentido negativo, o que é utópico é impossível, não vale a pena e até certo ponto, designa ignorância, inocência. Eu pensei: mas por que? Por que uma palavra com um significado tão amplo, tão rico foi reduzida a uma associação com a negatividade? Para chegar a uma resposta, analisei a definição da palavra no bom e velho Aurélio.

Utopia: s.f. Local ou situação ideais onde tudo é perfeito. &151; O substantivo utopia vem das palavras gregas ou e topos, q
ue significam sem lugar. Refere-se especialmente a um tipo de sociedade com uma situação econômica e social ideal. Freqüentemente a palavra é empregada para designar sistemas ou planos de reformas considerados pouco práticos ou irrealizáveis.

“Local ou situação ideais onde tudo é perfeito.” Parece bom... mas então por que, em grossas palavras, perfeito é bom e utópico é ruim?
Se o viver é uma eterna busca pela perfeição profissional, familiar, espiritual a qual temos plena consciência de que jamais alcançaremos, então por que buscar a perfeição é algo positivamente estimulado, mas seguir uma utopia é visto como infantilidade e tão abertamente reprimido? Eu digo o porquê. Porque a perfeição está associada ao campo do físico, do indivíduo e de tudo que o cerca diretamente, enquanto a utopia é relacionada ao campo das idéias, principalmente na relação com o social, o que não é lá muito interessante pra quem detém os privilégios provenientes de uma sociedade desigual. O que nos remete a outra parte da definição do dicionário.

Refere-se especialmente a um tipo de sociedade com uma situação econômica e social ideal. E o que seria uma sociedade ideal?
Bom, essa na qual vivemos é que não é e com certeza, estamos muito longe dela. E antes que digam que nunca chegarems a essa situação ideal eu digo: sim, eu sei. Assim como todos sabemos que jamais seremos pais perfeitos, profissionais perfeitos ou pessoas perfeitas. Mas ainda assim, buscaremos isso, não é verdade? Mas e buscar uma sociedade com uma situação econômica e social ideal? Porque isso é simplesmente um “sonho impossível” e não uma meta da sociedade como um todo? E porque, depois de tanto tempo de civilização estamos tão longe disso?


Me indagando sobre essas questões, me veio um exemplo em mente: o computador. É, isso que está viabilizando a exposição dessas idéias que escrevo. Esse objeto que faz parte de todos os nossos dias, ao qual dedicamos sempre algumas horas, seja para o trabalho ou o lazer e sem o qual não conseguimos mais viver sem. Quem diria há 200 anos atrás e menos até, que um dia seria possível que cada indivíduo tivesse um desses em sua própria casa e que ele seria a base para a criação de outras tecnologias inimagináveis. Muitos disseram que isso era impossível, mas isso não impediu outros de tentar e depois de tanto estudo e empenho, temos tudo o que temos hoje. E o computador, o Ipad, o Iphone não são perfeitos, acho que isso é bem claro para todos ou não perderíamos arquivos, não ficaríamos na mão por que um deles do nada não funciona ou porque foram invadidos por um vírus. Mas olhe o quão longe chegamos em tão pouco tempo e observe o quanto a busca pela perfeição teve papel essencial nisso, mesmo quando acharam que no mundo não existiria lugar para tal feito.

É então que vamos para outra parte da definição: o substantivo utopia vem das palavras gregas ou e topos, que significam sem lugar. Bem já sabiam os gregos que não há lugar para o ideal no mundo, nem mesmo a natureza é perfeita, ainda que esteja próxima disso, ou não existiria o câncer, por exemplo. Nada é perfeito nesse mundo e assim será até o fim dos tempos. Então qual é o sentido do ideal afinal? O ideal é a inspiração e a motivação o que nos faz caminhar em direção ao melhor que pode ser, o melhor que podemos ser. Então por que não seguimos a utopia? Por que não nos inspiramos nela, pra que consigamos chegar o mais próximo possível da perfeição social?

Entra em cena, então, a última parte da definição: Freqüentemente a palavra é empregada para designar sistemas ou planos de reformas considerados pouco práticos ou irrealizáveis. E foi assim que utopia virou uma coisa ruim. Foi associada ao fracasso, vista com desdém. Hoje, praticamente todos reproduzem essa idéia: quem segue uma utopia é aquele que acredita piamente que um dia tudo será perfeito, um sinal de infantilidade, mas com a idade e a experiência ele esquecerá isso e verá que nada irá mudar nunca. E assim, a sociedade se conforma com o sistema em que vive e por isso não caminhamos em direção a perfeição social, porque somos adestrados a vê-la não como inspiração, mas como um atestado de fracasso eminente.

Neste exato momento estamos todos parados, ninguém caminha, quem sabe estamos até retrocedendo no campo social, mas assim como buscamos a perfeição no campo pessoal, deveríamos todos seguir a utopia, um local (sociedade) onde não haja diferença de recursos entre os homens, onde as oportunidades sejam iguais assim como os direitos, onde não haja individualismo, onde o sistema dominante leve o nome do seu maior bem, mas que este sejam os seres humanos e não o capital. Parece ideal? Utópico? Pois então me inspira. Mais perto da utopia do que estamos com certeza podemos chegar, desde que caminhemos.


Ela

quinta-feira, 17 de junho de 2010

Para a Copa pode!!!

Na última terça-feira (dia 15/06) após o jogo da seleção brasileira estava caminhando pelas ruas do bairro da Tijuca, no Rio de Janeiro, e me deparei com uma multidão encarnada em verde amarelo inundando as ruas de alegria. Não mais que de repente, uma pergunta varreu meus pensamentos: o que legitima a paralização e a desordem do trânsito; a realização de shows em pleno dia útil e a ocupação dos cidadãos de espaços outrora ocupados apenas por automóveis?

Para responder a esta pergunta procurei na internet, em sítios vinculados as grandes corporações midiáticas do país, algumas reportagens que versavam sobre o assunto.


Alzirão vai ter shows de funk e samba

Várias ruas do Rio servirão de cenário para a torcida dar um “empurrãozinho” à seleção brasileira na conquista pelo hexa. Equipadas com telões e palcos para shows de funk e samba, a rua Alzira Brandão, mais conhecida como Alzirão, na Tijuca, na Zona Norte, espera receber mais de 30 mil pessoas na terça-feira (15), quando o Brasil estreia no mundial enfrentando a Coreia do Norte. A festa também promete se estender pelos outros bairros da cidade. A Secretaria municipal de Transportes fez um esquema especial de trânsito.

Em Copacabana, o monitoramento de trânsito começará cedo, a partir das 6h30 de terça-feira (15), 160 PMs, 90 guardas municipais e agentes da Secretaria de Ordem Pública (Seop) vão atuar no trânsito para evitar tumulto nas proximidades da Arena Fifa Fan Fest, na Praia de Copacabana. Também no mesmo bairro, a Rua Miguel Lemos terá reforço de guardas e PMs, para auxiliar na concentração de torcedores pelos bares da rua.



SP: Ministério Público não impedirá manifestação dos professores

De acordo com o Promotor José Carlos de Freitas, o Ministério Público não impedirá a manifestação de professores que será realizada pela Apeoesp, na Av. Paulista. A passeata deve ocorrer nesta sexta-feira, dia 12, como o previsto. O promotor analisou o Ofício da CET (Companhia de Engenharia de Tráfego) e afirmou que não tem como impedi-los de exercer o direito constitucional. "Juridicamente eles estão corretos. O problema é se explorarem o limite do vão livre do Museu de Arte de São Paulo (Masp) causando transtorno ao trânsito e pessoas", afirmou.

A Apeoesp comunicou a CET com antecedência sobre a manifestação que deve ficar no limite do vão livre do Masp. Segundo o Promotor, isso por si só, não causa violação aos direitos. Se a manifestação passar do limite do vão livre como o estipulado, o Ministério Público vai ingressar com ação e a Apeoesp será punida. "Em 2005 eles já tiveram uma condenação por esse motivo, inclusive, eu a estou executando. Temos também uma outra ação em curso de 2008", disse José Carlos de Freitas.



Essas duas notícias apontam uma contradição básica no que diz respeito a ocupação do espaço público. A primeira notícia dá conta de toda infra-estrutura montada pelo Estado e pela iniciativa privada para, nas palavras do repórter, dar um “empurrãozinho” à seleção brasileira. Na segunda reportagem podemos observar o acionamento do ministério público, a fim de impedir a manifestação dos professores sob a justificativa de paralisação do trânsito.

Se não me engano os dois eventos paralisaram e causaram efeitos significativos à rotina do trânsito das duas cidades e ambas lesaram em diversos níveis algumas necessidades individuais de muitos cidadãos. Então volto a perguntar: porque o Estado, a imprensa e a sociedade de uma forma geral apóiam determinadas manifestações públicas e condenam veementemente outras?

Fica evidente o direcionamento dado pelo aparelho do Estado, ideologicamente legitimado pela grande mídia, para as manifestações populares. Ao passo que somos educados e doutrinados a acreditar que qualquer tipo de reivindicação ou pressão popular é uma estratégia de desocupados que põe em risco a ordem social. Em outras palavras, isso quer dizer que só temos direito a cidade quando somos zumbis curtidos em álcool pouco preocupados se naquele instante tem alguém morrendo de fome, subempregado ou vendendo o corpo por algum punhado de moedas em busca da sobrevivência.

É importante deixar claro que não sou contra a copa do mundo e, muito menos, contra esse tipo de manifestação social. Acredito que devemos ocupar as ruas, reconquistar o que é nosso, reivindicar por uma maior dignidade, pelo direito a diversão, pelo direito a democracia, ou seja, pelo pleno direito a cidade!


Ele

sábado, 5 de junho de 2010

Zeitgeist - Parte I: O Filme

É, gente, depois de mais de um mês sem atualizações, eis que surge uma nova postagem. E que não confundam essa "reclusão" com descaso, interesse em expôr nossas idéias não nos falta, mas infelizmente e até certo ponto, também somos vítimas desse sistema que preenche nossos dias com afazeres, responsabilidades e inseguranças e o pouco tempo que nos resta, acabamos por dedicar ao ócio e a outros prazeres mundanos. Já parou pra pensar nisso? O quanto nossas rotinas, muitas vezes, não nos estimulam o pensamento? E se por acaso você pensar, ela ainda tenta lhe impedir de compartilhar suas idéias, tomando-lhe o tempo.

Acho que todo mundo já percebeu que não é lá de muito interesse da máquina-mundo o nosso pensar e a difusão de novas idéias que não auxiliem sua mera reprodução, mas hoje, ou ainda essa semana, vamos ignorar isso e fazer um pouco diferente. Pra isso sugiro que você reserve 2 horas do seu dia, qualquer dia, que seja hoje, amanhã ou ainda depois, mas reserve essas 2 horas para assistir a um filme que vai abrir seus olhos para o maior mecanismo de sustentação de poder no mundo: a manipulação. Ela que atravessou os séculos e nunca foi tão facilmente difundida e assimilada como é hoje. Ela que faz parte das 24 horas, dos 86400 segundos de todos os nossos dias sem que sequer notemos isso durante 1 segundo que seja.

Zeitgest vai falar detalhadamente sobre esse assunto, e concordando ou não com seu conteúdo, ele vai instigá-lo a refletir, a questionar e quando você menos perceber, talvez tenha a incrível sensação de que, até o filme, pode estar tentando te manipular...

Assista o filme na íntegra


Ela

sábado, 24 de abril de 2010

Vale a pena assistir!!!

Aqui vai a dica de um vídeo fantástico exibido no dia 12 de abril de 2010, pela Globo News. É uma entrevista com o geógrafo e professor David Harvey, na qual ele explica alguns dos princípios do capital que ocasionaram a onda de crises pelas quais ainda estamos passando. Não cabe aqui nenhum tipo de explicação acerca dos conteúdos abordados na entrevista, visto a clareza com que o entrevistado expõe suas idéias.

Só uma pequena ressalva: o início da entrevista é um popuco lento, mas vale a pena assistir tudo, do meio para o final é fantástico!


Ele e Ela

terça-feira, 13 de abril de 2010

Duas Histórias, Uma Realidade


CORREIO DO BRASIL
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25/3/2010 11:14:32
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Fiscalização multa rede de lojas Marisa por trabalho escravo
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Por Redação - de São Paulo
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A costureira ganha R$ 2 por peça!
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Uma inspeção de rotina de fiscais do Ministério do Trabalho descobriu, na capital paulista, nesta quinta-feira, trabalhadores bolivianos em condições análogas à escravidão em oficinas de costura contratadas pela rede de lojas Marisa. Cada trabalhador recebe R$ 2 por uma peça que será vendida a R$ 49,99 pela empresa. (...) O rastreamento da cadeia produtiva do setor de confecções levou a SRTE a encontrar trabalhadores, em geral bolivianos, sem registro, com salários de R$ 202 a R$ 247, menos da metade do mínimo brasileiro (R$ 510) e menos de um terço do piso da categoria. As condições de trabalho, saúde e segurança também eram inadequadas. De acordo com as investigações dos fiscais do trabalho, dos R$ 49,99 que um cliente da rede de lojas Marisa pague por uma peça, R$ 2 vão para o trabalhador (4%), R$ 2 para o dono da oficina (4%), R$ 17 para os intermediários (34%) e R$ 28,99 (58%) ficam com a Marisa. (...)

Ainda tem gente que acredita que o lucro é apenas uma relação entre custos e venda. A notícia acima é um exemplo claro da subordinação do trabalho (trabalhador imigrante sem quaisquer direitos) ao capital (Marisa) e é dessa relação, estruturalmente desigual, que resulta o grande estandarte de nossa sociedade, o lucro.

Não se trata aqui de fazer uma campanha contra as lojas Marisa. Esta situação não é exclusividade deste grupo empresarial, a precarização das relações de trabalho é algo corrente nos dias de hoje. Quem não conhece alguém que trabalha sem carteira assinada no regime de “associados” (principalmente advogados), que trabalha10, 11h por dia? Ou um professor que dá aula de 5, 6 escolas com 60, 70 horas por semana?

Guardadas as devidas proporções, a grande maioria das pessoas tem boa parte dos frutos do seu trabalho colhidos por terceiros e a cada dia que passa, somos impelidos a trabalhar mais, ganhar menos e levantar as mãos para o céu e agradecer por ter um “bom” emprego. O que torna essa relação mais complexa é que existem diferentes níveis de subordinação capital/trabalho. O nível de remuneração dada ao trabalhador é diretamente proporcional aos lucros gerados por ele, ou seja, um arquiteto que vira noites fazendo um projeto de um edifício de luxo que irá gerar muitos milhões para a construtora irá ganhar muito mais do que um pedreiro que é apenas um executor de funções facilmente substituído.

Essa divisão social do trabalho (extremamente complexa) é a semente de uma divisão segregacionista do espaço urbano. Uma sociedade estruturalmente desigual gera espaços a sua imagem e semelhança. As melhores áreas são reservadas a um pequeno grupo de pessoas que pode pagar por elas e o Estado, em todas as esferas de governança, segue com a função de provedor de infra-estrutura a fim de perpetuar a valorização da área. Para a grande massa de menos favorecidos, resta espaços degradados, mal servidos de aparelhos públicos e muitas vezes carentes de dignidade.

Acredito que é na complexidade da divisão social do trabalho, que diferencia aqueles que detem o capital daqueles que interessam ao capital e do grande número de marginais ignorados pelo mesmo, que reside a dificuldade de nos reconhecer enquanto um mesmo grupo, criarmos uma identidade de trabalhadores e, por fim (aonde quero chegar), reconhecer que a tragédia do Morro do Bumba é consequência dessa divisão social do trabalho da qual fazemos parte.


Geralmente, diante de tal acontecimento, somos quase que automaticamente impelidos a culpar sucessivos governos por sua irresponsabilidade e descaso. Refletindo com maior rigor crítico penso que é totalmente compreensível tais “atitudes governamentais”, visto que o Estado não é regido (de forma alguma) por valores de igualdade, justiça e cidadania. Ele é movido por pressões sociais, sendo uma espécie de balança pendendo sempre para o lado onde a força é exercida com maior vigor. Então quem é o culpado? A culpa está na estrutura da nossa sociedade que está por traz de governos, relações sociais e de trabalho. Parece fácil colocar a culpa em algo quase que metafísico como a “sociedade”, mas quem constrói a “sociedade”? Somos nós.

Nós que assistimos o crescimento das favelas, da violência e da pobreza e somos incapazes de nos colocar no lugar daqueles que vivem com dificuldades. Nós, que somos atores coadjuvantes na cena pública desse país e acreditamos que por uma ordem divina as coisas podem melhorar.

Sendo assim, pensar na tragédia do Morro do Bumba é enxergar além das desocupações de áreas de risco. É urgente pensarmos que tipo de sociedade queremos. É essa em que pessoas são exploradas ao limite e tem como recompensa o “justo” descanso em casas construídas em cima de lixões?


Ele

quarta-feira, 7 de abril de 2010

6/04/2010. Caos no Rio? Caos no mundo.


Chuva intensa no Rio de Janeiro, ruas alagadas, tráfego parado, serviços, aulas e trabalhos suspensos, desabamentos, lixo, ruas completamente vazias, mortos, caos.

Esse foi o cenário de ontem, terça-feira, dia 6 de abril de 2010, o dia em que a cidade maravilhosa parou e assistiu horas e mais horas de noticiários sobre destruição, isso quando não estava no meio dela e é nesse cenário caótico que se vê florescer grande parte da generosidade e da solidariedade humana. Em comunidades mais carentes onde os desabamentos se fizeram freqüentes, a população se juntou para dar abrigo, comida, resgatar soterrados, mesmo com pouquíssimos recursos.

O curioso que pude perceber é que esse tipo de comportamento não foi uma regra em lugares onde o risco de morte não estava em jogo, como se a solidariedade não fosse importante em todos os momentos do dia e a todos que precisarem de algum tipo de socorro. Digo isso por que um momento simples do meu dia a dia, algo que faz parte da rotina de milhares de brasileiros, ontem mais do que nunca, revelou-me o quanto somos mesquinhos, individualistas, egocêntricos e, se é que a palavra “sociedade” pode ser aplicada a nossa forma de organização, o quanto somos uma sociedade fraca, doente, baseada em fundamentos vazios, embora hajam algumas boas teorias do que deveríamos ser.


Ontem, às 6:15h da manhã eu estava num ponto de ônibus lotado, debaixo de chuva, esperando o bendito 607 que me levaria na hora para o meu estágio. Não foi bem assim que aconteceu, três deles passaram direto, abarrotados de gente, sem espaço nenhum para que outras entrassem. Foi então que o 4º ônibus da linha passou e foi obrigado a parar por causa do sinal fechado e quem estava do lado de fora logo percebeu que havia um grande espaço vazio no fundo do veículo, embora várias pessoas insistissem em se apinhar na frente dele, impedindo a passagem dos demais. Prontamente, todos na rua começaram a gritar para que as pessoas chegassem para o fundo do ônibus, todos provavelmente muito atrasados depois de perder outro três e querendo logo sair da chuva e seguir para o trabalho.

Logo depois da roleta uma mulher que se encontrava sentada em frente a trocadora bradava para quem quisesse ouvir que o motorista era um corno por ter parado no ponto e deixado mais gente entrar pra espremer quem já se encontrava no interior do veículo. Dizia que era falta de bom senso dele, se tantos outros ônibus passaram direto, ele deveria fazer o mesmo, porque não? Óbvio que esses comentários geraram grande tumulto, uns falavam que era fácil falar estando sentada confortavelmente, outros que não eram obrigados a agüentar esse aperto num transporte coletivo, alguns apenas soltavam palavrões a esmo e, enquanto a chuva provocava o caos deslizando encostas, desabando casas e alagando residências, o egoísmo instaurava uma batalha dentro de um ônibus.


E assim foi durante 1h, discussões infindáveis, xingamentos, gritos e um outro episódio que merece destaque. Um homem em pé abria janelas a sua frente sem dar satisfações a quem se encontrava sentado embaixo delas e essas pessoas fechavam de novo as janelas para não se molharem, sem se importarem com o calor que imperava em um veículo entulhado de gente e completamente fechado. Em algum momento da discussão e troca de palavrões entre os envolvidos, o homem de pé falou:

- Mó calor infernal dentro do ônibus e vocês não estão nem aí.

- Lógico! Eu por acaso sou obrigado a me molhar por sua causa? - respondeu um homem sentado.

- E eu sou obrigado a sentir calor por causa de você? – revidou o de pé.

Bom, eu não sei vocês, mas nesse momento me deprimi. É sem dúvida uma bela “sociedade” a que construímos, na qual todos nos reconhecemos como estranhos e não como iguais, queremos nos dar sempre bem e somos incapazes de ceder, incapazes de doar, de sermos generosos no nosso dia a dia. Somos um enorme grupo de egoístas e individualistas fingindo que convivemos uns com os outros e que nos esforçamos para sermos bons. Milhares de anos de evolução e chegamos a isso, a falta de carinho e compreensão com o próximo, a ausência de compaixão e a supervalorização do próprio nariz.
E é incrível como em diferentes escalas, somos todos assim, ou melhor, nos tornamos todos assim, e a maioria não vê sequer isso como um problema e não tem a menor ambição de que algo mude. Ontem me questionei muito e quase afirmei a impossibilidade de mudança, mas hoje é um novo dia e como este, outros virão e quem sabe qual será aquele em que vai ser lançada a primeira semente a levar a humanidade para um caminho melhor?

6 de abril de 2010, terça-feira, chuva intensa no Rio de Janeiro, ruas alagadas, tráfego parado, serviços, aulas e trabalhos suspensos, desabamentos, lixo, ruas completamente vazias, mortos, caos.

Não.

6 de abril de 2010, terça-feira, egoísmo intenso no mundo, ausência de compaixão, supervalorização do próprio nariz, incapacidade de doar, de generosidade no dia a dia, de nos reconhecermos como iguais. Mentalidade egocêntrica, uns são mais importantes, merecem mais que outros e essa é a sociedade que construímos e aceitamos como normal.
Isso sim é o caos.

Ela

segunda-feira, 29 de março de 2010

Nas Terras do Bem Virá


Hoje não vou discorrer sobre mais uma opinião minha ou nossa. Vou apenas fazer uma recomendação de um filme que mexeu muito conosco quando o vimos pela primeira vez na TV Brasil, há mais de um ano atrás. Aqui eu vou deixar apenas o trailer, mas o arquivo completo pode ser baixado por esses sites de download da vida, ou mesmo visto em partes pelo youtube.

Uma breve sinopse:

"Nas Terras do Bem Virá" se trata de um documentário realizado por Alexandre Rampazzo e Tatiana Polastri, gravado em 29 cidades de cinco estados do norte e nordeste brasileiro e que aborda entre outros assuntos, o modelo de colonização da Amazônia, o massacre de Eldorado do Carajás, o assassinato da missionária Dorothy Stang e o ciclo do trabalho escravo.


Aqui tem dois sites que encontrei com o arquivo do filme, mas não sei qual a qualidade deles. Espero que ajude quem se interessar em assistir a obra na íntegra, vale muito a pena.

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Quem assistir e tiver vontade de discutir algumas idéias, sinta-se à vontade. Afinal, esse aqui é um espaço feito para todas elas.


Ela